jueves, 15 de marzo de 2012

A diretora do museu

A Diretora Do Museu
Nas indas e vindas de Zé Inácio sempre estavam o botequim de fim de semana, o futebol com os amigos e o trabalho duro durante a semana. Como fisioterapeuta, seu assunto era de ossos, nervos, músculos, estrutura corporal, essas coisas técnicas que para ele era pura diversão, mas isso não atraía nenhuma graciosa mulher na sua cidade.
A solteirice já lhe pesava nas costas, vivia de aluguel, mas era como se fosse sua casa, tinha seu carro popular, não um Wolkswagen, mas o levava para todo lado e quase não dava manutenção, já passava dos trinta e a mãe pedindo um neto. Na verdade o que não agradava Zé Inácio era chegar a casa à noite e deparar-se com a televisão, alguma rede social na internet, do que não era muito fã e coisas de trabalho levado para o lar; o histórico de algum cliente com problemas raros e pouco mais. Ele gostava de conversar, de jogar papo para o ar com os amigos, mas lhe faltava aquela “amiga” do cafuné e do carinho...
Não aceitando essa situação ele tratava de flertar com as moçoilas da cidade, acudia a bares badalados, festas noturnas e eventos sociais. Foi em um barzinho, desses com música ao vivo, que ele avistou Alícia, com três amigas, pedindo canções de Noel Rosa para cantor da ocasião: Elas riam e se divertiam, mas os olhos de Zé Inácio não saiam da tez branca e suave daquela mulher, devia haver “trintado” também, usava uns óculos modernos de armações finas e por trás uns olhos verdes que eram de feitiçaria, boca fina como era do seu gosto, cabelo curto e dentes branquinhos no sorriso fácil. Ele estava ali sentado com Maurício, seu companheiro de bar e futebol, quando rolou um samba antigo. Zé rompeu o silêncio e comentou:
- Gostei mesmo daquela ali, na mesa das três gatinhas.
- Qual?
- A de vestido preto e cabelo curto (Zé Inácio adorava um pretinho básico)
- A de óculos?
- Ela mesma.
- A Alícia! Que diferença de gostos que temos...
- Você conhece! Hum... Vamos falar de negócios – Era uma piada comum de Zé.
- Eu não suporto essa mina, metida a intelectual, só fala de Paris, Arte Moderna, Impressionismo, não me impressiona em nada.
- Pois a mim sim.
- Ela é a diretora do museu, aquele que você nunca foi! - Retrucou Maurício com pouca vontade de seguir no assunto.
Foi nessa hora que Zé Inácio pensou: “Será que é mesmo meu número?”. Ele não sabia bulhufas de pintura, escultura, e outros gêneros das artes plásticas, para ele Picasso era motivo de piadas de mau gosto e Modigliani era nome de pizzaria.
Naquela noite não pintou nenhum olhar esperançador, nenhuma risadinha, nada... O mais provável é que ela nem o havia visto. Para variar o Zé no zero, de zero a zero mesmo.
No fim de semana seguinte quando abre seu Facebook lhe salta Maurício no chat:
- Você não gostou da diretora, a do museu?
- Claro!
- Pois é, vai rolar um coquetel da inauguração de uma exposição de Arte Moderna
lá no museu, você topa?
- Será? Não sei...
- Vai haver comes e bebes, e mulheres!
- Bom... vamos nessa e ver no que dá, nunca fui lá mesmo...
Maurício não era desses aficcionados em arte, mas que tinha a carteirinha de sócio do “CCC”, Comando Caça Coquetéis. Passou na casa de Zé Inácio às 20 horas e foram cair lá no museu. Ao simplesmente entrar, nosso protagonista ficou chocado, pois além de quadros, haviam umas instalações estranhas, um vaso sanitário pintado com palavras soltas escritas ao redor, uma parede cheia de pregos de distintos tamanhos, arames retorcidos com formas grotescas, bem diferentes do que ele havia pesquisado na internet sobre arte. Tinha visto fotos de estátuas gregas, de quadros Rembrandt e Van Gogh, nada a ver com aquilo.
Quando avistou Alícia, toda aquela parafernália (no conceito de Zé Inácio) se tornou pano de fundo. Desta vez trajava um vestido azul, esvoaçante, na altura dos joelhos que lhe deixou encantando. Hoje parecia mais meiga em comparação as risadas que soltava no barzinho. Um disco de Chopin reverberava de fundo e tudo propiciava para um “bote”, romântico, claro. Ao vê-la sozinha diante de um quadro se apressou, se aproximou e comentou:
- Que expressivo, não?
- O contato da tinta intermediado pelo pincel me provoca sensações diversas - Respondeu a moça.
- Eu também fiquei emocionado com as cores fortes – se arriscava Zé Inácio.
Ela caminhou e mudou de posição enfrentando-se a uma parede onde havia uma escultura feita de sucata. Zé Inácio relaxou e soltou seu verbo habitual:
- Esse aí assaltou um ferro velho! Hahaha – o velho bom humor de Zé.
Nesse instante Alicia de revesgueio lhe mira com seus olhos penetrantes por detrás daquela armação, com uma feição de poucos amigos, analisa de cima em baixo o rapaz, que em seu pensamento praguejava “que idiota, que burro, que cagada!”, até que rosto dela afrouxou e sorriu “ Não é que é mesmo!”.
Foi a glória de Zé, ela quebrou o gelo e até se interessou pelos assuntos fisioterapêuticos do rapaz, ela adorava uma massagem e ele era especialista!
Foi se embora o zero a zero oficializando o namoro. Resulta que os dois tinham mais coisas em comum que se arriscaria Maurício, aquele que facilitara o processo apesar de não ir muito com a cara de Alicia. No final descobriram os dois amigos que ela não era tão metida a intelectual e até era bem divertida, inclusive se arriscava na sinuca!(O Zé adorava uma sinuquinha).
Passado uns tempos da relação Zé Inácio se interessou mais por arte moderna, se identificando com alguns gêneros das artes plásticas como a escultura. Só que ainda não engole coisas estranhas como aquele vaso sanitário, aquilo para ele não é arte. O que ele gosta mesmo é da beleza, muito mais que da originalidade.